Aterro sanitário não basta: é preciso uma política para conscientizar a população, alerta a coordenadora do CDDHPJ Conceição Amorim
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| Foto: Williana Costa |
Desde 1991, Imperatriz destina seus resíduos ao lixão da Estrada do Arroz. Naquela época, a população era de cerca de 225 mil habitantes e o lixão recebia menos resíduos. Hoje, com mais de 273 mil habitantes, estima-se que o volume diário de lixo ultrapasse 250 toneladas, totalizando cerca de 7.500 toneladas por mês, em um espaço saturado que ameaça diretamente o Rio Tocantins. O município ultrapassou o prazo legal — agosto de 2023 — para encerrar o lixão e implantar o aterro sanitário, mas a obra, iniciada em 2022, sofreu paralisações, disputas judiciais e ainda não foi concluída. A previsão de entrega era para novembro de 2024, e em uma nova gestão em janeiro de 2025, a obra segue parada.
O problema, porém, não se resume à construção do aterro. A gestão inadequada dos resíduos sólidos expõe a população a riscos ambientais e de saúde, ao mesmo tempo em que evidencia a ausência de políticas públicas. Sem um programa consistente de educação ambiental e a importância da separação do lixo, o aterro pode rapidamente se transformar em um novo lixão, repetindo o ciclo de degradação que Imperatriz convive há mais de três décadas.
É nesse cenário que a ativista de Direitos Humanos Conceição Amorim aponta, nesta entrevista ao jornalista Jornalista Josué Moura, no programa Conexão Maranhão da rádio TopFM, que a situação atual do lixão e reforça a necessidade de políticas públicas que integrem direitos humanos, direitos das mulheres e meio ambiente, destacando que apenas a obra, por si só, não garantirá a mudança necessária.
Entrevista com Conceição Amorim fala sobre catadores, aterro sanitário e educação ambiental em Imperatriz
Entrevistador: O Centro tem um trabalho em relação aos catadores de lixo, os agentes ambientais, que agora são chamados assim. Teve um encontro na Câmara debatendo essa situação. Como você explica isso para os nossos ouvintes?
Conceição Amorim: Na verdade, o Centro de Direitos Humanos, nos últimos cinco anos, tem aprofundado o debate com a sociedade sobre mudanças climáticas. Estamos aqui na Amazônia Maranhense, uma região muito afetada. No ano passado, tivemos cem dias de calor intenso, chegando a 39,6 graus. A nossa região está muito desmatada e sofre as consequências dos lixões, que existem em todo o país. Eles são responsáveis pela emissão de gases extremamente prejudiciais à camada de ozônio, além de causarem impactos à saúde e à poluição do solo.
O Brasil e Imperatriz já tiveram oportunidade de construir um aterro sanitário, mas, sem um processo de educação ambiental, aquela oportunidade de 2004 não se concretizou. Hoje, o aterro está em processo de construção, mas parado novamente. Já foi construído 53%. Temos várias discussões em torno disso: reduzir a emissão de gases de efeito estufa, diminuir o adoecimento da população devido ao lixão, que existe desde 1980, e como contribuir para que essa riqueza imensa que é o lixo não seja desperdiçada.
Entrevistador: Ou queimado, não é?
Conceição Amorim: Exatamente. Muitas pessoas poderiam sobreviver com a reutilização e venda de produtos, mas sem coleta seletiva, muito se perde. O Centro, no meio dessa luta ambiental, tem dado ênfase à construção do aterro e à criação de políticas do município e do estado de atenção aos catadores ou agentes ambientais. Esse é um mercado que pode incluir muitos trabalhadores.
Entrevistador: Claro, o lixo às vezes é até luxo se você souber aproveitar.
Conceição Amorim: É. Quando você conversa com os trabalhadores do lixão, escuta histórias inacreditáveis. Por exemplo, uma vez alguém encontrou um relógio que valia R$ 7 mil. Mas existem muitos problemas: ontem mesmo um catador denunciou que, quando o caminhão de lixo chega, já joga o lixo sobre o que está queimando, e eles perdem a oportunidade de coletar materiais que poderiam vender. Por isso, o lixão precisa ser encerrado, e precisamos ter nosso aterro. Mas, se não houver uma campanha massiva junto à população, para ensinar a separar o lixo doméstico, o aterro pode virar um novo lixão.
Entrevistador: Eu bato muito nessa questão da conscientização. Já presenciei situações em que o lixo era jogado em qualquer lugar, e cheguei a ser ameaçado por isso. Acredito que o poder público precisa investir em conscientização, e não só em punir.
Conceição Amorim: Já existe projeto de lei sobre isso, mas o problema é a fiscalização.
Entrevistador: É, porque às vezes o poder público se esforça, recolhe o lixo, mas no dia seguinte o mesmo local está sujo.
Conceição Amorim: Por isso, nossa luta vai além. Queremos oportunizar os agentes ambientais e catadores a aproveitar pelo menos 90% do lixo produzido em casa. Separando o lixo seco do molhado, você já ajuda muito. O lixo molhado é comida que não se reaproveita, mas o seco pode ser reutilizado. Também é importante que a administração pública inclua mais pessoas nesse trabalho.
Entrevistador: As empresas também podem ajudar, colocando contêineres, por exemplo.
Conceição Amorim: Sim, se o material for entregue separado, dá a chance de outras pessoas aproveitarem. Mas a população precisa fazer esse exercício. A prefeitura deve organizar a coleta: um dia o lixo seco, outro o molhado, para não contaminar o material reciclável. Assim, a chance de aproveitar quase todo o reciclável aumenta.
Entrevistador: Não é fácil, mesmo para quem tenta.
Conceição Amorim: Exatamente. Às vezes você lava a garrafa, coloca a tampa, a caixa de leite precisa ser lavada, senão apodrece e contamina. Eu moro sozinha com minha filha, e fazemos esse esforço de separar papel, plástico, sacola e garrafa. Dentro de casa, nosso maior problema é nos livrarmos do que produzimos — cada família produz em média 5 a 6 quilos de lixo por dia. Estamos fazendo experiências de separação e tentando gerar riqueza a partir disso.
Entrevistador: Exatamente. As pessoas podem ganhar algo com isso.
Conceição Amorim: Sim, dá para ganhar muita coisa. O aterro sanitário está sendo construído para 30 anos de vida útil, mas se tudo for misturado, não vai aguentar. Essa luta está ligada à justiça climática e à aceleração das mudanças climáticas. Também queremos incluir famílias que já são agentes ambientais, mas que não recebem para fazer a coleta seletiva.
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